Petrarca - O Dignificador do Soneto


Petrarca, que, como Dante, preferia, a princípio, o soneto constituído por uma oitava e um sexteto, de versos encadeados, também como ele acabou reconhecendo o plano final de Guittone d’Arezzo. Dante e Petrarca elevaram à perfeição essa forma poética, e alcançaram a quintessência da inspiração, iluminada de beleza humana e de fulgor divino.

O esquema autenticado por Petrarca foi, portanto, o seguinte:
ABBA ABBA CDC DCD, modelo consagrado mundialmente com o nome de "soneto petrarquiano".

É o soneto clássico, escolhido pelo grande poeta, que, a despeito disso, admitiu muitas variações de rimas, principalmente nos tercetos, a parte nobre do poema.

No capítulo inicial, discorremos, ligeiramente, sobre a atividade literária de Petrarca, em termos de língua latina. Sem demérito para a qualidade excepcional de sua atuação nesse terreno, Petrarca se notabilizou pelo que produziu empregando a linguagem toscana.
Universalmente aclamado como o poeta lírico do amor, seus êxitos imarcescíveis residem nos sonetos que consagrou a Laura de Noves. A Petrarca se atribui a nomeada do soneto, que ele urdiu com as vibrações de sua iluminada inteligência e de seu alto poder criador. Deu vida nova ao soneto. Transmitiu-lhe calor suficiente para atravessar, incólume, a frialdade dos séculos.
Fora de qualquer dúvida, conferiu elegância, pureza e sensibilidade à língua italiana.
Era o petrarquismo.

A 1
ª edição dos sonetos de Petrarca, "Il Canzonieri", segundo a Enciclopédia Barsa, é de 1470. O manuscrito-autógrafo, no dialeto toscano, está guardado na Biblioteca do Vaticano. São 317, dos quais 227 escritos quando vivia Laura de Noves, e 90 produzidos após morte daquela que foi o seu amor platônico. Os sonetos, no volume, estão entremeados de canções, sextinas, baladas e madrigais: 87 alegorias da vida humana — os triunfos do amor, da pureza, da morte, da fama, do tempo e da eternidade (ou de Deus). Total: 404 produções.

Petrarca teria sido urna soma do "Dolce Stil Nuovo" e dos artifícios provençais. Os seus sonetos, depois de lograrem celebridade na Itália, começaram, a partir do século XVI, a exercer influência marcante nas outras literaturas européias, palmilhando rumos os mais diversos. Todos os estilos, todos os movimentos literários, todas as Escolas, herdaram e aprenderam, sempre, alguma coisa do petrarquismo, que nasceu predestinado para servir de espelho às composições do gênero.

O Soneto, na inspiração de Petrarca, representou tanto, ou mais que a Ode, na obra de Horácio. Ao dedicar todo o seu gênio ao soneto, o poeta italiano ombreou-se com Quintus Horatius Flaccus (Venosa, antiga Venusia, na Apulia, 65-8 a.C.).
E não ficaria mal na pena de Petrarca o célebre verso do poeta latino, um verdadeiro grito de vitória (Ode XXIV, VI):
"Monumentum exegi aere perennius",
ou seja,
"Terminei um monumento mais duradouro que o bronze".







(Das páginas 85 a 87 de "O Mundo Maravilhoso do Soneto", de Vasco de Castro Lima)







4 comentários:

  1. Trabalho de grande utilidade para atender à natural indagação dos estudiosos sobre as fontes e origem dessa tão simpática forma de tão antigo e amável gênero. O Professor Vasco de Castro Lima faz um apanhado minucioso e necessário para a compreensão da importante matéria. Apresentando excelentes exemplos, vivifica a admiração de todos os tempos e de todos os poetas acerca do Soneto como delicada forma literária. E as críticas que alguns fazem denunciam a capacidade de encantar dessa forma imortal de poesia, enquanto a incapacidade de compô-los...

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  2. DE VEZ EM QUANDO
    (Claudeciano Alves)

    De vez em quando e só de vez em quando
    eu penso em ti, num divagar silente;
    e a tua imagem, que ficou na mente,
    tão mansamente vai se dissipando...

    E começo a sentir que, de repente,
    num tom mais calmo, cada vez mais brando,
    a tua voz em mim vai se calando,
    e em tudo o mais tu vais ficando ausente.

    E vão ficando agora só pequenos
    restos, traços de ti... desconfortantes...
    que também vão já se fragmentando.

    A tua ausência cada vez dói menos...
    Às vezes, dói-me ainda, assim como antes
    – de vez em quando... só de vez em quando.

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  3. SILENCIOSAMENTE
    (Claudeciano Alves)

    Ontem revi-te... As velhas cicatrizes,
    as heranças do amor em nossas vidas,
    no coração tornaram-se feridas
    que vão ficando em mim feito raízes.

    Davam nossos olhares diretrizes
    do que dizermos: coisas já vividas.
    Mas nossas bocas, sempre emudecidas...
    — nada te digo e nada tu me dizes.

    Tanto a dizer nós tínhamos; contudo,
    continuas calada e eu sigo mudo,
    mas meu olhar co'o teu dialogava...

    E tive a sensação, p'ra meu encanto,
    de teres dito tu que me amas tanto
    e eu ter te dito o tanto que te amava...

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  4. MAIS SUBLIME
    (Claudeciano Alves)

    Não é amor o que sinto. Não, não deve
    ser amor. Sempre que amei nesta vida,
    não foi assim tão bom, tão puro e leve,
    nem me trouxe esta luz enternecida.

    O amor, quando o vivi, durou tão breve,
    e isto que eu sinto traz em si contida
    uma paz de alma que não se descreve,
    e um tempo terno, calmo e sem medida.

    Não deve ser amor. É mais sublime.
    Pois o amor, este que dizem, oprime,
    sufoca, prende, cobra e se desgasta.

    E isto que sinto de mim nada exige
    e, ao ser amado, dor nenhuma aflige
    — senti-lo apenas satisfaz-me... e basta.

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