António Barroso (Tiago)

Vila Viçosa, Alentejo, Portugal (1934-...)


AINDA MAIS
 António Barroso (Tiago)    

(A minha mulher Olívia)

Busquei, querido amor, lá nesses céus,
A luz que me dá vida, que me guia,
Busquei a sua origem, dia a dia,
Até que a encontrei nos olhos teus.

Ergui, bem alto, a voz, orei a Deus
E pedi-Lhe, repleto de alegria,
Que as emoções que, junto a ti, sentia,
Fossem, para sempre, os sonhos meus.

E se o amor me diz que a busca é finda,
Meu coração desperta em mil natais
Cada um brilhando em cor tão linda,

Que os nossos segredos serão iguais:
 Tu dizes que me queres mais ainda!
 Eu juro que te quero ainda mais!

Parede - Portugal



A MULHER
António Barroso (Tiago)

Quando, numa alma pura, amor se encerra,
É como ver brilhar um malmequer
Um corpo acetinado de mulher,
Como lema de paz em nossa terra.

E se um grande conflito não se encerra,
Mesmo co’o alarido que se fizer,
Usará tudo aquilo que puder
Para findar o flagelo duma guerra.

Mulher é meiga, amiga, uma doçura,
É um enorme poço de ternura
Com nascentes de linda poesia.

É filha, esposa, amante e mãe também,
Nos muitos nome que há, ela só tem
Um lindo e sagrado que é Maria.

Parede - Portugal



AMORES DE VERÃO
António Barroso (Tiago)  
                         
Tardes de estio do meu Alentejo
Com moças belas, na rua, passando,
Vagos olhares, rubor de desejo,
E no meu coração as ia guardando.

E iam, e vinham, se tinham ensejo,
E eu, mudo e quedo, amava-as, olhando
O ar furtivo que me atirava um beijo
Perdido nas pedras que iam pisando.

E na tarde morna, cálida, amena, 
Nasciam amores cheios de pena
P’los que morriam no mesmo momento,

Ao ver as moças passando, maldosas,
Co’o lenço escondendo as faces de rosas
E risos enchendo o meu pensamento.

Parede - Portugal



A FESTA
António Barroso

Como recordo aquela madrugada
Com os sinos a tocar no alto da igreja,
Já passa a banda, em farda bem vincada,
Tocando marchas de fazer inveja.

Dia de festa, em sonhos, tão esperada,
O som do morteiro, no céu, troveja,
No varandim, a moça debruçada,
Roda o vestido p´ra que a gente veja.

E o baile? Ah! O baile na noite quente,
No palco improvisado, mesmo à frente
Da casa de meus pais, onde eu vivia,

Era um sublime culminar de festa.
Agora, anos depois, já só me resta
Meter num sonho as emoções dum dia.

Parede - Portugal



A FEIRA
António Barroso

 Oh! Chico, Rogério, Zé Manel!
Mas logo a seguir: - Pai, olha balões!
Gritava a forte voz do carrossel:
 São três voltas! Três voltas, dez tostões!

E as gemas envolvidas em papel!
E as rodas de madeira! E os camiões! 
E o torrão duro, doce como o mel!
E a dura cantilena dos pregões!

 Mãe, pai! Queria tanto um pirolito!
E havia tal prazer neste meu grito,
Que logo me diziam: - Filho, vai.

E era assim um longo dia de feira
Que acabava, depois da brincadeira,
A dormir junto ao peito do meu pai.

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VILA VIÇOSA, NO ALENTEJO
António Barroso (Tiago)

I

Mais delicada e linda neste mundo?
A terra onde nascemos, tão formosa,
Que tem por seu nome Vila Viçosa
De igreja ao alto e com castelo ao fundo.

Quando se chega e se pára um segundo,
Se contemplam casas majestosas
Nas ruas perfumadas pelas rosas,
Há um prazer enorme e bem fecundo.

Por todo o lado, há paz, amenidade,
Há sossego, há amor, felicidade,
E ternura, tão simples, tão singela,

Que, nunca mais, alguém pode esquecer
A glória desta terra, por saber
Que em Vila Viçosa nasceu Florbela.

  
II

Florbela, que prazer minha alma tem
Por saber que te encontras sempre bela,
Que vagueias, agora, como estrela,
Neste céu que é de todos, de ninguém.

Tomara eu ser um mago que contém
Poder p’ra te fazer a Cinderela,
Serias mais formosa, ainda, que ela,
Voltarias à terra, para alguém.

E essa tua tristeza acabaria,
Porque o amor buscarias, dia a dia,
E sempre, sempre de cabeça erguida.

E eu sonhei que isso vai acontecer
Para que nunca mais possas dizer:
 Eu sou a que, no mundo, anda perdida.

Parede - Portugal



COMPANHIA
António Barroso (Tiago)   
                       
Florbela, conterrânea, companheira,
Infeliz pelo tanto que te deste,
Regavas o amor, à tua beira,
Com lágrimas do muito que sofreste.

Pudera eu achar mágica maneira
De ter vivido o tempo em que viveste,
Seria dedicar-te alma parceira,
Confidente amiga que não tiveste.

E então, talvez o amor fosse alegria
Florescendo em jardim de fantasia
Com pétalas brilhando à luz da lua.

De mãos entrelaçadas, caminhando,
Terias sossegado, repousando
No conforto duma alma gémea tua.

Parede - Portugal

                  

PARA BOCAGE
António Barroso (Tiago)   

Deixa, Bocage, que teus versos sejam
A musa inspiradora deste escrito,
Porque muito, de ti, já se tem dito,
Nem sempre com verdade, pois te invejam.

Permite, assim, que meus olhos te vejam
Como tu sempre foste, um ser proscrito
De quem ninguém ouve o clamor, o grito,
Ou as lágrimas que as faces te marejam.

Alimentaste amor por todo o lado,
Sempre de coração apaixonado,
Por Marília, Tirsália, por Arnia,

Ou ainda, por Filis, Nise, Anarda.
São tantas, tantas, que teu peito guarda,
Que não cabem na tua poesia.

Parede - Portugal
                


A RAÇA
António Barroso (Tiago)

As tágides do Tejo, regressaram
Para cantar Camões e sua glória,
E trouxeram consigo, na memória,
Mares que os portugueses navegaram.

As musas, co’o poeta, edificaram
A epopeia que canta essa vitória
Dum povo que escreveu a sua história
Por terras tão distantes, a que ousaram.

Lusíadas que as musas, quais sereias,
Espalham pelas praias, nas areias,
As lendas que se contam nos serões,

Quando as ninfas acabam seus cantares,
O vento leva, a todos os lugares,
Esses feitos descritos por Camões.

Parede – Portugal (02/10/2013)



NAVEGAR COM PESSOA
António Barroso (Tiago)

Com Pessoa, eu queria Navegar,
Gozar a luz do sol, do firmamento,
Não segurar a brisa, nem o vento,
Só por minha vontade, me guiar.

Se um sorriso, na face, começar,
Prendê-lo, com um fio, ao pensamento,
E buscar o perdão por um momento,
Infeliz, que se teve, sem pensar.

Guardar o meu amor num cofre forte,
Ver o céu, para a lua, ser suporte,
Sulcar o mar imenso, sempre à proa.

Gostaria, num sonho tão disperso,
Navegar com um leme feito verso,
Seguir, acompanhado de Pessoa.

Parede – Portugal (25/09/2013)



VELHA MENINA
António Barroso (Tiago)
                              
Vi-te passar, sorrindo, descarada,
A cada um que contigo se cruzasse,
Tua boca era uma montra avermelhada
Pedindo um aluguer ou um trespasse.

E lembrei-te, menina, de mão dada,
Com as fitas da touca num enlace,
Ao seguires para a missa, bem corada,
Com caracóis voando em tua face.

Aproximei-me lenta, tristemente,
Não te lembraste, apenas um cliente,
Mais um a quem te entregares, vencida.

Olhei-te e não vi traços de esperança,
Já não vais à missa, como em criança,
Perdeste toda a fé, negaste a vida.

Parede - Portugal



PROVA DE CORAGEM 
António Barroso (Tiago)  
                                          
Ides ler, se tiverdes paciência,
Mal amanhada rima, mas sentida,
Da mocidade, uns laivos de inocência,
Depois, sonhos desfeitos duma vida.

E, se aos primeiros falta experiência,
Nos segundos a dor foi mais sofrida,
Que a juventude sente impaciência
E o ocaso da velhice, a fé perdida.

Não sei se terão beleza ou graça,
São só memórias do tempo que passa,
Recordações presentes, do passado.

São versos simples feitos para mim,
Mas se os conseguirem prender, no fim,
De todo o coração, digo: Obrigado!

Parede - Portugal



CARIDADE
António Barroso (Tiago)

Num cofre de carinho tens, no peito,
Amor p’los infelizes deste mundo,
E os teus sorrisos são, sempre a preceito,
Consolo permanente e bem profundo.

Se as tuas mãos são rosas que, no leito
Da pobreza, vão confortar tão fundo,
Teu doce olhar transforma, com efeito,
Um mendigo errante em ser fecundo.

És meiga, caridosa, tão prestável,
Tão fresca, tão bondosa, tão amável,
Que me pergunto, ante esse porte nobre:

 Porque me não ofertas um sorriso,
Porque me não vês quando eu preciso,
E porque não te dás, se sou tão pobre?

Parede - Portugal



RETRATO INCOMPLETO
António Barroso (Tiago)   

P´ra pintar o teu rosto em fina tela,
Roubei ao arco-íris as cores brilhantes;
Nos lábios pus romãs e, da aguarela,
Só pintei, nos teus olhos, diamantes.

Nas fúrias do mar busquei procela
Que me mostrasse vagas espumantes
P’ra, com outras cores, ter a mais bela
A pôr nos teus cabelos ondulantes.

Nos retoques finais dei, com firmeza,
Pinceladas de amor que lhe faltavam,
Com traços de emoção e de beleza,

Mas quebrei os pincéis que te pintavam,
Rasguei a tela, repleto de tristeza,
Por notar que teus olhos não me olhavam.

Parede - Portugal


                        
A FUGA 
António Barroso (Tiago)
                                    
Nesse passeio, pela vez primeira,
Quando te mostrei o trigo louro,
Logo foste arranjar arte e maneira
De o medir em cifrões. Um mau agouro!

Depois, nessa vivenda sobranceira
Ao jardim, na praceta do pelouro,
Toda essa matemática certeira
Só media a beleza em peso de ouro.

Ao te deixar em casa, ainda havia
Pairando, algumas leis de economia
A par dum capital em rendimento,

Ficaste, então, depois, surpreendida
Por eu não te beijar, na despedida.
Temi que também fosse investimento!

Parede - Portugal



ROSAS EM VERSO 
António Barroso (Tiago)
                             
Pena presa, nos dedos, firmemente,
Olhar, em ponto vago, concentrado,
Nas laudas de papel, à sua frente,
Um poema mal escrito, só esboçado.

Se o espírito adormece e fica ausente
Como, por mil duendes, embalado,
Por sonhos doutro mundo voa a mente,
Qual cavaleiro em seu corcel alado.

E se alguém se revolta, se ergue e clama, 
Numa feroz censura, em voz que brama,
Na simplicidade dos seus afectos,

Só diz, abrindo a mão, erguendo o braço,
Como quem deita rosas do regaço:
— São meus versos, senhora, meus sonetos!

Parede - Portugal


DOCE VISÃO
António Barroso (Tiago)   

Contemplo o mar, ao longe, calmo e lindo,
Dum azul que não lembra tempestade,
Mar que é tão grande, um oceano infindo
Que leva e traz mensagens de saudade.

Beija as praias que as águas vão cobrindo
Das ondas mansas a espumar vaidade
Dum país onde o sol nasce sorrindo
Nas manhãs, ao romper da claridade.

As areias coloridas de dourados
Ocultam, de olhares, os namorados
Que ali se refugiam de quem passa,

Por isso, não me canso da cambraia
Das ondas que este mar rola na praia,
Este mar, este mar que nos abraça.

Parede - Portugal



O MOTIVO 
António Barroso (Tiago)  
                            
Se há, dentro de nós, um santuário
De tantas emoções que nos percorrem,
São esses sentimentos relicário
De que todos os poetas se socorrem.

À fantasia e ao sonho imaginário,
Dedico mil poemas que me ocorrem,
A uns dou vida, em forma de diário,
Outros vão passando e, assim, morrem.

Queres que te defina o belo, a vida, 
O ar que me rodeia, a dor sentida,
A flor que brilha, o sonho que eu abraço!

São momentos fugazes que a alma abriga,
Por isso, não me peças que eu te diga
A quem dedico os versos qu’inda faço.

Parede - Portugal



A QUARTA DIMENSÃO
António Barroso (Tiago)

Subi, num raio de luz, ao firmamento,
Em busca duma estrela cintilante,
E julgando encontrá-la, por instante,
Segui no dorso, cavalgando o vento.

Quedei-me em Marte, num encantamento,
Passei, na Lua, tarde e de rompante,
Em Vénus, julguei ver a luz brilhante,
Em Saturno, chorei meu desalento.

Regressei triste, só, desiludido,
Supondo que o meu sonho era perdido
— A estrela em que pusera tanto gosto

Mas olhei, em meu redor, e vi então,
Que a luz que procurei, com emoção,
Resplandecia toda no teu rosto.

Parede - Portugal



SONHO DISTANTE
António Barroso (Tiago)
                       
Se o sonho é o desejo transformado
Em certezas que a vida não consente,
Quisera eu poder, mesmo acordado,
Sonhar a vida inteira, docemente.

Sonhar que, junto a ti, o mundo é lindo,
Que o amor que me juras é um hino,
Sonhar que, de mãos dadas, vamos indo
Caminhando, lado a lado, sem destino.

Se sonhar é tudo isto, eu não queria
Que pudesse acordar jamais um dia,
P’ra não perder, do sonho, esta ventura

De apertar-te, nos braços, com carinho,
Beijar-te os lábios rubros, de mansinho,
De afagar-te os cabelos, com ternura.

Parede - Portugal



SORRISO TRISTE 
António Barroso (Tiago)

Sorri, sorri sempre, sem temor,
Inda que seja triste o teu sorriso,
Sorrindo, com ternura e com amor,
Dás um pouco de ti, quando é preciso.

Sorri pois, com meiguice e com calor,
Sorri ao aleijado, ao sem juízo,
Mesmo triste, sorri perante a dor
Que em teu redor se forma, sem aviso.

Não sei que mais te diga, mas sorri,
 Se não p'ra alguém, ao menos, para ti,
 E que teu rosto mostre o teu sentir.

 Porque, neste mundo em que a dor existe,
 Mais triste do que o teu sorriso triste,
 É a tristeza de não saber sorrir.

 Parede - Portugal



DESEJO OCULTO
António Barroso (Tiago) 
   
Quem dera ir p’ra donde já não venho,
Tivera eu, p’ra dar, o que não dou,
Quisera ter aquilo que não tenho,
Pudera eu ser aquele que não sou.

Rogara desejar o que desdenho,
Soubera não querer quem se afastou,
Tomara ter amor, com muito engenho,
P’ra repelir a dor que me restou.

E, então, toda a verdade esclarecia
O meu ser tão confuso, atribulado,
Sofrendo a cada instante, dia a dia,

E o pensamento triste, ora animado,
Seria eterna fonte de alegria
Porque amar de mais não é pecado.

Parede - Portugal



A ESTÁTUA
António Barroso (Tiago)
                                
O general de bronze, austero e rude,
Altivo em cavalo de porte e raça,
Traz-me à lembrança a nossa juventude
No bucolismo antigo dessa praça.

A esverdeada patine tinha a traça
Dos pombos que poisavam, amiúde, 
Enchendo o ar dum esvoaçar de graça
Como símbolos da paz e da virtude.

Sentados nos degraus do pedestal,
Naquele dia longo e soalheiro,
Olhos nos olhos, num quente desejo,

Recordo que, esquecendo o cavaleiro,
Foi à sombra desse velho general
Que ousámos trocar o primeiro beijo.

Parede - Portugal



O JARDIM 
António Barroso (Tiago)
                                
Era um palácio com jardins cuidados,
Árvores frondosas de sombra amena
Vestiam, com seus ramos, namorados
Que, ali, buscavam a ventura plena.

Os silêncios só eram perturbados
P’los sinos que chamavam à novena,
Ou por outros companheiros alados,
No alto dos ramos, copiando a cena.

E nessa languidez de tarde quente,
Soltando suspiros de amor ardente,
Recordas-te, amor, de tanta emoção

Quando, em longos beijos sensuais,
Teu corpo me pedia sempre mais
Com teu seio anichado em minha mão?

Parede - Portugal



FLOR ESQUECIDA 
António Barroso (Tiago)
                           
Floriu a primavera numa rosa,
Mas o Inverno ficou, com a lembrança
Da mão pedindo a esmola caridosa
Que já não mata a fome da criança.

E a flor que vai crescendo, tão formosa,
Lembrando verões quentes de esperança,
Esquece, longe, a guerra impiedosa
E, perto, aquela paz que não se alcança.

As pétalas já luzem sob o sol
De cada madrugada, ao arrebol,
Cansadas da mudez da longa espera.

Se os homens não se entendem nesta terra,
A rosa fica murcha porque a guerra
Não a deixa florir na primavera.

Parede - Portugal



NUNCA MAIS
António Barroso (Tiago)
                                
Não quero mais amar, já não te quero.
Não te desejo mais, já não desejo.
Esperar o teu amor, já não espero.
Beijar a tua boca, eu já não beijo.

Sentir o teu calor, eu já não sinto.
Eu não te chamo mais, já não te chamo.
Mentir-te, com verdade, já não minto.
Desisto de te amar, já não te amo.

Não te pretendo mais, eu não pretendo.
Se me prendi demais, já não me prendo.
Corri, atrás de ti, mas já não corro.

Não preciso mais de ti, eu não preciso.
Já não quero sorrir, nem teu sorriso,
E se já, por ti, morri, ainda morro.

Parede - Portugal



CONSTRANGIMENTO
António Barroso (Tiago)
                           
Numa roda de amigos se brincava
Com o signo dos anos dos presentes,
E tu disseste, quando se indagava:
— Eu sou virgem!  Palavras inocentes!

Anos mais tarde, um grupo se formava
Em teu redor. Talvez maledicentes,
As mesmas questões. Tua voz soava:
— Sou virgem!  No tom de quando mentes.

Nesse tom carregado de ironia,
Eu vi quanta tristeza nele havia
Por promessas quebradas, é verdade,

Num passado repleto de ventura,
E confesso que, ao ver essa amargura,
Me senti um criminoso em liberdade.

Parede - Portugal



A FLOR ENCARNADA
António Barroso (Tiago)
                            
Que será feito da flor encarnada
Que sempre nascia, na primavera,
Junto ao muro do ribeiro, colada?
Era sonho?... Ilusão?... Era quimera?...

Olho, agora, o muro, e não vejo nada.
Será mesmo que a flor se regenera?
E com a alma tremendo, angustiada,
Abro o coração e fico à espera.

E mais um dia passa sem saber
Se inda irá brotar, se inda irá crescer
Nesse lugar agreste, mas risonho.

E como água correndo no ribeiro
Abarco toda a cena, por inteiro,
Esperando acordar deste meu sonho.

Parede - Portugal



AMIGOS 
António Barroso (Tiago)

Minha vida foi dura tempestade
Vencida no convés da solidão,
Nas vagas dum mar em convulsão,
Pela força do leme e da vontade.

E por todo o lado andei, na ansiedade
De almejada busca, duma ilusão
De achar, em porto calmo, meu irmão
Com velas enfunadas de amizade.

O mar, agora azul, tão espelhado,
Reflecte conselhos esperançado
Que siga na procura, sempre em frente.

Assim, passei dias procurando
Amigos que, por fim, fui encontrando
Tão tarde nesta vida e tão contente.

Parede – Portugal



O REGRESSO
António Barroso (Tiago)  
                                 
Qual fénix das cinzas renascida,
De novo, junto ao muro do ribeiro,
Eu vejo aquela flor que era perdida,
Brotar, surgir, viver nesse canteiro.

E, da janela, inquiro, de seguida:
— Minha amiga, onde foi teu paradeiro
Nesta longa espera que foi sentida
E me fez entristecer o ano inteiro?

E ela risonha, simples, mas vaidosa,
Respondeu, reluzindo a cor formosa:
- Amigo, não sei bem que se passou,

Não sei, porque dormi sono profundo
E vagueei, no tempo, pelo mundo,
Até que, ao acordar, Deus me chamou.

Parede - Portugal




OLHOS DE ALMA
                         António Barroso (Tiago)                         

(Dedicado  a uma  senhora que não  conheço,
mas que, com simpatia, elogiou meus versos)

Os lindos olhos que meus versos leram
E deles se agradaram, num momento,
Não sabem que outros tantos se esconderam
Rubros de prazer, num deslumbramento.

Foram olhos de alma que se ergueram
P´ra versos sem qualquer merecimento,
Com bondade, dos erros se esqueceram,
Porque só sabem ler com sentimento.

São versos meus, só meus, e não mereço
Que alguém, por eles mostre tanto apreço,
Se bem que lhes dê vida, sempre crente.

No fresco entardecer, gozando a calma,
Todo esse olhar que nasce dentro d´alma,
Não sabe censurar, apenas sente.

Parede - Portugal


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