Tentativa de Posfácio



O insigne mestre da língua, Professor Cândido Jucá (filho), deu mostras de uma paciência e uma resignação dignas de Jó, ao ler, em 1977, esta obra, ainda em seus cinco primitivos volumes de originais manuscritos, fazendo-lhe encômios que estamos longe de merecer. Algumas de suas observações feitas a lápis, nas margens das folhas, transportâmo-las para o texto do livro, como transcrições de frases que, obviamente, não constam de nenhum de seus trabalhos publicados.

Em 30 de junho de 1980, o eminente filólogo, depois de relê-la, já datilografada, entregou em mãos do seu autor uma carta, que assim começa:
 Poeta Vasco de Castro Lima,
 a vida tem disto...

Calha uma pessoa de encontrar uma outra quando menos espera, nos meandros caprichosos da existência, e logo por ela se encanta, e se sente capaz de qualquer sacrifício... Por vezes há reciprocidade. E é assim como o espontar de um amor à primeira vista... que nem todos compreendem... que alguns não levam a sério.

É um fascínio, que pode tomar feições imprevisíveis, surpreendentes, e que explicam o comportamento de casais incomuns.
Porém o que é mais difícil de aceitar é o caso de não ser vivente o objeto dessa inclinação.
É possível que alguém se dedique a um ser ideal como se fora a um ente vivo, pessoa humana?

Pois este é o caso do Poeta Vasco de Castro Lima.
Aos quatorze anos já era um enamorado do Soneto; e a sua grande atividade no mundo, a sua dedicação à família, a sua pontualidade no cumprimento do destino, nada o arredou de devotar-se à instituição do Soneto, que ele penetrou, devassando-lhe a formação, a origem, a sua alma".

Depois de tecer judiciosas e variadas considerações, inclusive sobre a Poesia e a Rima, "na qual o Soneto tem grande parte de sua elegância e nobreza", Cândido Jucá (filho) escreveu o seguinte:
 "Sei que "O Mundo Maravilhoso do Soneto", é obra a Que Vasco de Castro Lima não conseguirá pingar o ponto final. Ele está organizando o que poderia chamar-se a "Enciclopédia do Soneto", ainda em 1ª edição". 

Tem razão o mestre. 

O grande escritor e poeta Rangel Coelho deu à apresentação deste livro o modesto nome de "Tentativa de Prefácio". Pois bem, não obstante o conteúdo, altamente generoso, de suas apreciações, somes alheios à veleidade de admitir tivéssemos esgotado o assunto da história do Soneto. 

Nada disso. A desejada "Enciclopédia do Soneto" não poderia ser obra apenas de um pesquisador, ou ensaísta. Seria glória muita para a faina de um homem que sempre viveu e sofreu o emaranhado labor de todos os dias, e que, na prática de sua arte, nunca lhe foi fácil atender ao chamado daquela voz teimosa reboando desde o fundo da alma e do espírito. 
Não se tornará impossível — porque inexiste o impossível neste mundo — a realização do ideal de Cândido Jucá (filho). 

Nosso sonho, entretanto, é bem menor. Não passaria de um vôo lento do mais frágil de todos os condores que, no máximo, aventurar-se-ia, com árduo sacrifício, a ultrapassar a cordilheira verde-azul dos Andes. E o sonho de Jucá, muito mais temerário, seria o ímpeto arrojado de uma nova fênix, fabulosa e renascida, que, mesmo assim, só chegaria ao seu termo nas fronteiras do infinito. 

Outros idealistas o conquistarão. Pena que nem Jucá, já levado por Deus, em 1982, nem nós, estaremos vivos para assistir e aplaudir tão extraordinária proeza.

*

Não queremos terminar sem reproduzir, guardadas as devidas proporções, algumas linhas escritas por Will Durant, em 12 de maio de 1957, no prólogo de um dos volumes de sua monumental "História da Civilização" (volume que corresponde ao n9 15 da coleção de 17, editada, em português, pela Companhia Editora Nacional, de São Paulo, 1957/1959):
 "Tentei ser imparcial, embora saiba que o passado de um homem sempre influi nos seus pontos de vista, e que não há coisa mais irritante do que a imparcialidade". (....) "Se a Morte não intervier, haverá um Volume de conclusão... Nesse ponto faremos nossa reverência e nos retiraremos, profundamente gratos a todos que carregaram o peso destes volumes nas mãos, e perdoaram os erros inúmeros de nossa tentativa de desvendar o presente no seu passado essencial, pois o presente é o passado acumulado para a ação, e o passado é o presente desvendado para nossa compreensão".

*

E, antes, em março de 1935, no prefácio que escreveu para o primeiro volume de sua obra, o próprio Will Durant lembrava este registro com que Tai Tung, no século XIII, lançou a sua "História da Escrita Chinesa": "Se eu esperasse a perfeição, este livro não seria terminado nunca".

Finalmente, fazemos nossas, também, estas palavras de Will Durant: "Àqueles que chegaram até aqui, o meu "obrigado", pela companhia, que, mesmo de longe, não deixei de sentir".

Rio de Janeiro, Janeiro de 1987.
Vasco de Castro Lima


2 comentários:

  1. O que diremos nós, amantes do Soneto, tão pequenos à vista da grandiosidade do trabalho de Vasco? Simplesmente que SONETOS NÃO MORRERÃO, primeiro porque não são simples explosões de sentimentos, mas trabalhos que envolvem cuidados minuciosos e uma "performance" que dificilmente se consegue.Ave, SONETO!

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  2. A extraordinária beleza do soneto pode lá morrer???

    Obrigada, Vasco de Castro lima!

    Obrigada, Regina Coeli!

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