ADAGAS CUJAS JÓIAS VELHAS GALAS...
Fernando
Pessoa
Adagas
cujas jóias velhas galas
Opalesci
amar-me entre mãos raras,
E
fluido a febres entre um lembrar de aras,
O
convés sem ninguém cheio de malas...
O
íntimo silêncio das opalas
Conduz
orientes até jóias caras,
E
o meu anseio vai nas rotas claras
De
um grande sonho cheio de ócio e salas...
Passa
o cortejo imperial, e ao longe
O
povo só pelo cessar das lanças
Sabe
que passa o seu tirano, e estruge
Sua
ovação, e erguem as crianças
Mas
no teclado as tuas mãos pararam
E
indefinidamente repousaram...
(Soneto retirado do
site Pensador.uol.com.br)
DESGASTES...
Maria
João Brito de Sousa
"Adagas
cujas jóias velhas galas"
De
um tempo requentado e bolorento,
Encastrando
o metálico cinzento
Davam-me
a sensação de ver bengalas,
"O
íntimo silêncio das opalas"
E
alguma estranha graça a que acrescento
Tudo
quanto me ocorra, enquanto tento,
Uma
a uma, (re)tê-las, observá-las...
"Passa
o cortejo imperial, ao longe",
Evocando
invasões, louros, matanças...
Toca,
pr`a mim, com placidez de monje
"Sua
ovação, e erguem as crianças" ...
Já
nada vejo além de adagas gastas;
Nem
Édipos me turbam, nem Jocastas.
(Maria João Brito
de Sousa - 03.12.2016 - 12.57h)
QUALQUER
COISA DE OBSCURO PERMANECE
Fernando
Pessoa
Qualquer
coisa de obscuro permanece
No
centro do meu ser. Se me conheço,
É
até onde, por fim mal, tropeço
No
que de mim em mim de si se esquece.
Aranha
absurda que uma teia tece
Feita
de solidão e de começo
Fruste,
meu ser anónimo confesso
Próprio
e em mim mesmo a externa treva desce.
Mas,
vinda dos vestígios da distância
Ninguém
trouxe ao meu pálio por ter gente
Sob
ele, um rasgo de saudade ou ânsia.
Remiu-se
o pecador impenitente
À
sombra e cisma. Teve a eterna infância,
Em
que comigo forma um mesmo ente.
(In,
pensador.uol.com.bras)
CONTRASTE
(Chiaroscuro)
Maria
João Brito de Sousa
"Qualquer
coisa de obscuro permanece"
Na
sombra de uma luz, quando se acende
O
brilho da luzerna que pretende
Iluminar
alguém que a não conhece;
"Aranha
absurda que uma teia tece",
Que
fia cada fio que em manto estende,
Porquanto
desse manto ela depende
E
tão só pelo manto permanece,
"Mas,
vinda dos vestígios da distância",
Como
um resto de cinza incandescente
-
qualquer restinho é sombra de importância... -,
"Remiu-se
o pecador impenitente"
Dessa
louca obsessão feita inconstância,
Mas
permanece a sombra, omnipresente.
(Maria João Brito
de Sousa -04.12.2016 - 14.30h)
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