Por João Roberto Gullino

DESPREZAM-ME, MAS ME INVEJAM
Tribuna, 29.04.17


No meio literário, muitos se julgam o máximo em sapiência com uma ideia fixa em desqualificar o soneto na forma tradicional. Os argumentos são os mais esdrúxulos: uns usam como argumento as rimas pobre, quando tal detalhe não tira o valor do conteúdo se trata-se somente de uma diferenciação entre as ricas e as preciosas. Outros argumentam as regras rígidas (não devem respeitar leis); e ainda há quem use o desprezo à inspiração quando tudo na vida exige inspiração, tanto para um poema livre, uma musica,  uma crônica e, indo mais longe, até para se programar uma viagem. Portanto, todos os argumentos são capengas, o que só vem demonstrar um preconceito que, de um modo geral,  não passa de comodidade. Ninguém é obrigado a escrever sonetos, como ninguém é obrigado a gostar de um time de futebol ou de uma comida, pois gosto não se discute mas bom senso sim. Normalmente, critica-se e reprova-se somente aquilo que não lhe agrada.

O que ninguém entende sobre a peculiaridade do soneto é que, dentro da poesia, trata-se de um trabalho matemático, de raciocínio, um perfeito quebra-cabeça para dificultar sua feitura, como dizia Gonçalves Crespo – “um animal bravio, mas que pode ser domado facilmente por qualquer poeta que conheça suas regras”. As comparações são inúmeras mas ressalto uma de Majô & Machado, na internet, que o comparam ao vinho – “se tomado puro, é vinho; se misturado com água e açúcar é refresco”.

Apesar e até em função do tempo passado – o que vem a ser, realmente, o modernismo senão uma epidemia passageira que, na maioria das vezes, se torna grave, ao minar todo o sistema imunológico da beleza e da sensibilidade, para infectá-lo com o vírus da “criatividade”– um mal endêmico corrosivo que, no descuido, mata pela irreverência da mediocridade?

Por isso digo – “Nunca despreze o soneto / alma e vida da poesia / tal e qual um amuleto / com toda sua magia”. Isto é uma trova – o estilo mais conciso de poema que, se fugirem de suas regras básicas, deixará de sê-lo, transformando-se numa simples quadrinha. E o poeta Carlos Martins, com muito acerto, diz que todo bom poeta deve entender de metrificação mesmo que não venha utilizá-la, como qualquer profissional deve ter as ferramentas necessárias para exercer bem sua profissão.

Para mim, como para muitos, independente do estilo, poesia que agrada é aquela que tem a necessária essência e lógica, que prende a atenção, atinge nossa sensibilidade e que sempre queremos retornar após sua leitura. Este é a finalidade real da poesia em oposição à prosa. Mas como disse o poeta Roger Feraudy  em “A última rosa”: “Mas ainda há no abismo desse mundo,/ por entre o lodaçal do modernismo,/ uma pequena rosa... lá no fundo” – 

jrobertogullino@gmail.com 
Petrópolis, RJ, 25.04.17




Um comentário:

  1. Prezado Gullino, envio-lhe saudação de parabéns pela magnífica matéria publicada. Abraços aos poetas petropolitanos, especialmente aos membros da Academia de Letras Raul de Leoni.
    José Antonio Jacob

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