Portugal
UMA CONCHA PERDIDA...
Maria
das Dores Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
Se um dia, à beira-mar, vires caída
Uma
concha luzente e prateada,
Envolta
pela espuma rendilhada
Da
onda, sempre altiva e presumida.
Curva-te de joelhos, dá-lhe um beijo
E
não a deixes só, leva-a contigo.
Faz
do teu coração o seu abrigo
E da
tua alma, o sol do seu desejo.
De areia foi seu berço, e por encanto
O
luar que raiava quis-lhe tanto
Que
a sua argêntea cor logo lhe deu.
Mas o mar, cobiçoso, quer roubá-la;
Por
isso, vai depressa procurá-la
E
guarda essa conchinha — que sou eu!
(Fevereiro de 1950)
(Fevereiro de 1950)
O NOSSO LIVRO
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
Amor, é para ti, só
para ti
Este livro —
farrapo de mim mesmo,
Versos que eu
arranquei, talvez a esmo,
De cada desengano
que sofri.
São versos
pobrezinhos, mas sentidos,
Singelos na
estrutura, mas ditados
Por um não acabar
de magoados
Pesares, em sonetos
convertidos!
Este livro de
versos, é o grito
Que rasgou
aguarelas de infinito
No sangue de uma
luta sem vitória...
Aguarelas sem
cor... fundo imperfeito...
Sangue vivo que
escorre do meu peito
Na ânsia de contar
a nossa história!
(13 de maio de
1954)
GUADIANA
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
Estás triste,
Guadiana, porque choras?
Porquê esse
murmúrio dolorido?
Eu 'stou junto de
ti horas e horas
E escuto sem cessar
o teu gemido.
Contei-te a minha
dor, minha saudade,
Meu sofrimento
atroz, meu desalento...
E agora choras tu o
meu tormento
Enquanto o mundo
ri, sem piedade!
Ó lindo Guadiana,
rio de prata,
O desgosto que
sinto e que me mata,
Crê que só tu o
sabes... mais ninguém...
Guarda bem para ti
o meu segredo,
E reza, num
murmúrio doce e quedo,
A dor que os outros
olham com desdém!
(Dezembro de 1949)
ESSA CONCHA
PERDIDA...
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
(em resposta a um poeta desconhecido)
Dizes que me
encontraste? Puro engano!
Esse grito que
ouviste não foi meu.
Quanta concha
perdida o Oceano
Guardou nas suas
ondas, sem ser eu!
Teu sonho foi
ousado, meu amigo,
E não é nada bom
fantasiar.
Como podia eu viver
contigo?
Que vida tinha eu
para te dar?
Meu coração é
grande como o mar,
E eu sei que uma
vez só se pode amar,
Pois se conchinha
sou, mulher nasci...
Essa concha
perdida, que fui eu,
De saudade e de
amor quase morreu
— Mas foi por outro
alguém, não foi por ti!
(Maio de 1950)
TÉDIO
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
Um dia abri meus
olhos para a vida,
E abri-os tão
sòmente para ti,
Que só nesse
momento conheci
O tormento de estar
adormecida.
Vivo e não tenho
alento, nem vigor...
Sinto-me presa a ti
por fortes laços.
E na doce prisão
dos teus abraços
Pra sempre
enclausurei meu grande amor.
Tu nunca saberás
quanto te quero!
E não digas, nem
penses, que exagero
Se juro ter nascido
para ti...
Não duvides de mim.
Vivo morrendo...
E sinto-me morrer,
porque, vivendo,
Sei bem que para
sempre te perdi!
(Outubro de 1950)
OS TEUS CABELOS...
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
Eu perdi-me na
noite borrascosa
Dos teus negros
cabelos ondeados...
Miragem que
guardei, toda orgulhosa,
No álbum dos meus
sonhos encantados!
Perdi-me nessa
noite! E no negrume
Dos mais variegados
pesadelos,
Me vi, sem um
suspiro ou um queixume,
Envolta na prisão
dos teus cabelos.
Agora sou cativa, e
piedade
Não peço, pois, pra
mim, a liberdade
É sentir-me por ti
acorrentada...
A teus pés estarei
de noite e dia,
Como escrava sem
carta de alforria
Ao teu jugo pra
sempre condenada!
(Dezembro de 1950)
MEMORANDO
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
(A memória de Maria Domingas)
Quando a vida era
chama, e luz e cor,
E o mundo uma
promessa de ventura;
Quando, entre
desenganos, o amor
Surgia em suas asas
de ternura,
Uma espada de gumes
afiados
Tua vida ceifou,
sem piedade,
E foram os teus
risos consumados,
No braseiro fugaz
da mocidade.
Mas tu, que eras
Jócista e és Cristã,
Desta vida tão
lúgubre, tão vã,
Saudade não levaste
certamente...
Não doa a tua morte
aos que ficaram.
Que as mágoas desta
vida terminaram,
E o Céu te guardará
eternamente!
(Outubro de 1953)
MEUS VERSOS
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
Estes versos são
lágrimas que choro,
Pranto que eu
acalento no meu peito.
São versos, são
amor, amor desfeito,
Rimas que sem
querer guardo e decoro.
A vida é um poema,
é fantasia,
Um drama, onde há
mentira e há cinismo.
A vida! (Uma
tragédia, imenso abismo
Envolto de beleza e
poesia!)
Versos! Sois minha
vida, meu sentir,
Eterna confissão
que, sem mentir,
Eu faço a toda a
gente que me escuta...
Frases que rimam,
bálsamo que acalma,
Versos que são
farrapos da minh'alma,
Razão do meu amor,
da minha luta!
(Janeiro de 1951)
PROCURANDO
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
Eu procurei, na
luz, a minha vida,
Minh'alma em
escuridão triste eu buscava.
Quis encontrar a
paz que ambicionava,
Mas também essa
paz... era perdida.
Corri montes e
vales, perguntando,
A todo o vagabundo
que passava,
Se na senda tortuosa
que eu pisava
Hav'ria a paz que
eu ia mendigando.
Ninguém me
respondeu; fui caminhando,
E perdi ao Senhor,
quase chorando,
Forças para tão
íngreme subida.
Mas Deus não quis
ouvir-me. Regressei.
E foi nesse momento
que encontrei,
A única razão da
minha vida!
(Janeiro de 1951)
MÃE
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
(À minha Mãe)
Mãe! Se não foras
tu, como podia
Gozar eu este dom
que a vida oferta?
E como contemplar
tanta harmonia
Que o mundo, em seu
redor, "spalha e liberta?
Não ver as
avezinhas inocentes
Pipilar,
descuidadas, o seu canto...
E não sentir, do
amor, os tons ridentes,
Plenos de
Primavera, e sol, e encanto!
Oh! Se não foras
tu! Se em doce anelo
Não sentisses
quanto era grande e belo
O milagre de amar e
ser querida...
Ao mundo não terias
feito vir
Um pequenino ser,
pra repartir
O dom que Deus te
deu, ao dar-te vida!
(25 de março de
1952)
NOCTURNO
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
Existe à minha
volta um negro abismo
Que me esmaga,
entristece e apavora.
Um vácuo
transbordando pessimismo,
Um peso que me mata
e me devora.
E procuro saber
qual a razão
Deste duro sentir,
tão magoado;
Mas nunca, nunca
encontro explicação
Para o meu padecer
continuado!
Em vez de coração,
Deus, no meu peito,
Uma pedra quis pôr,
do mesmo jeito
Que essas pedras
que dormem na calçada...
Pedras que todos
pisam e desprezam,
Onde o sol, onde a
chuva nunca pesam,
E a neve não receia
ser manchada...
(Maio de 1952)
PRELÚDIO
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
Na gélida visão do
meu passado,
Há negrume e há
noite, noite escura,
Há sombras onde a
sombra do pecado
Me parecia envolta
de candura!
Meu coração,
marmóreo, não pulsava,
Minh'alma,
amortecida, não vivia.
"Stavas junto
de mim, e eu não te amava,
Ou já te amava
muito... e não sabia!
Deus tinha-me
criado para ti;
E para te
encontrar, eu conheci
As ciladas dum
mundo malfazejo.
Mas encontrei-te,
amor! Foi-se a tristeza.
— Que a vida é
sempre plena de beleza,
Se há duas bocas
juntas, num só beijo!
ANEL DO NOSSO AMOR
Maria das Dores
Dominguez Ramirez (PENÉLOPE)
Aliança de amor,
louca ternura
Encerra e simboliza
o meu anel,
Que em asas de quimera
e de ventura
Brilha na minha
mão, como um broquel!
Fortaleza me dá,
porque assegura
A sedução do teu
amor fiel
— Com um nome, uma
data e uma jura
Que gravou
indelével o cinzel.
Anel do teu amor,
do nosso amor,
Arauto que proclama
quanto ardor,
Noss'alma
palpitante em si reune...
Anel do nosso amor!
Anel doirado,
Suspenso em minha
mão, iluminado
Pla chama
incandescente que nos une!
(Maio de 1954)
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