O Arcadismo; O "Grupo Mineiro"



Diz a Delta Larousse, no verbete "Arcádia": “Arcádia, em gr. Arkadia, nome da Grécia, no centro de Peloponeso. Região de pastores, a Arcádia guardara sua primitiva população de pelasgos. As cidades (Mantinéia, Orcômena, Tégea) agruparam-se em confederações, depois entraram na Liga Aquéia e lhe deram seu chefe mais ilustre, Filopêmene. / Lit. Em poesia, outrora chamava-se "Arcádia" a um país imaginário de felicidade bucólica, evocado pelos poetas renascentistas (Sannazaro, Montemayor, Sidney)".

O Lello Universal acata esses dados, mas, em aditamento. oferece outros, que podem ser assim resumidos, o que fazemos, apenas, a título de ilustração:
No verbete "Pelasgo": "Língua dos Pelasgos e que se falava ainda, ao que parece, no século V, antes da nossa era, na costa da Trácia, no sul da Propôntida e em certas ilhas como Imbros e Lemnos, onde, em 1885, apareceu uma famosa inscrição, aliás ainda não interpretada".

No verbete "Pelasgos": "Povo antiquíssimo que ocupou, nos tempos pré-históricos, a Grécia, o Arquipélago, o litoral da Ásia Menor e a Itália. Esta população primitiva nunca constituiu, sem dúvida, uma nação definida; foi expulsa ou reduzida à escravidão pelos Helenos. Antes da conquista dos seus territórios pelos Gregos, os Pelasgos, agricultores e pacíficos, haviam erguido em torno das suas cidades muralhas ciclópicas, formadas por enormes blocos de pedra, indestrutíveis, apesar de construídas sem cimento. Admite-se geralmente que os antigos trácios, frígios, lídios, etruscos, epirotas, iiírios, italiotas (samnitas, oscos, etc.) e os Albaneses atuais são ramos mais ou menos cruzados dos Pelasgos"

"O nome de Arcádia — escrevem Antônio Cândido e J. Aderaldo Castello — evoca a região da Grécia em que se localizou convencionalmente o modelo ideal da vida rústica; e os membros daquela associação tomaram pseudônimos e se chamaram de pastores, tratando de pastoras as suas personagens femininas".

Houve a célebre Arcádia Romana, criada em 1690, tendo raízes no romance pastoril, em prosa e verso, de Jacopo Sannazaro (1456-1530), "no qual a vida campestre é idealizada como verdadeiro estado de poesia".



O ARCADISMO EM PORTUGAL


O Arcadismo (ou neoclassicismo), derradeira manifestação da literatura clássica portuguesa, teve como doutrina reformar o gosto literário.
Os reformadores se reuniram na "Arcádia Lusitana", ou "Arcádia Ulissiponense", que foi fundada em 1756, tendo como modelo a Arcádia Romana. Suas reuniões se realizavam nas praças e nos bosques.

Por que Arcádia Ulissiponense? É o mesmo que Olisiponense, forma correta, relativo ou pertencente a Lisboa; lisbonense. E o Lello Universal nos explica a origem da palavra: "Segundo a fábula, Ulisses, nas suas viagens ou "errores", veio ao território ibérico do litoral do Atlântico e fundou no Tejo uma cidade, “Olisipo", hoje Lisboa".

Surgiu a Arcádia Lusitana, para sepultar o "seiscentismo", seja, o barroco literário de origem espanhola, substituindo-o pela imitação dos clássicos latinos e gregos. Horácio, Virgílio e Ovídio (latinos), Anacreonte, Píndaro e Teócrito (gregos) voltaram a brilhar com seus gênios imortais. E até os clássicos “quinhentistas" portugueses, como Camões, Sá de Miranda e Rodrigues Lobo, foram revalorizados, passando a ser objeto da mesma devoção.

Foi idealizada em 1756 e fundada no ano seguinte, por Anjo Diniz da Cruz e Silva (1731-1799) e Manuel Nicolau Esteves Negrão, e lá estava expresso na introdução do seu estatuto: “O grande desejo que temos de ver renascida em Portugal aquela áurea simplicidade, bom gosto e delicadeza, que já viu florescer nos escritos dos seus autores do século XVI (que para Portugal é o século de ouro) nos moveu a fundar nesta Corte um erudito Congresso...”

Antônio Diniz foi poeta de pouco merecimento. Formado em Direito, viveu longos anos no Brasil. Celebrizou-se, apenas, por ter servido na Alçada que julgou e condenou os Inconfidentes Mineiros.

A Arcádia teve uma vida intensa, de 1757 a 1760, e realizou sua última sessão em 1770, segundo Fidelino Figueiredo, ou 1774, conforme a Delta Larousse. A ela, pertenceram Bocage, Nicolau Tolentino e outros poetas do período de transição do Classicismo para o Romantismo. Também participaram poetas brasileiros que comungavam do mesmo ideal literário.

O emblema da Arcádia Lusitana era um lírio branco, símbolo da Imaculada Conceição. E a divisa representada pela expressão latina "Inutilia truncat", significando o desejo de banir tudo o que fosse supérfluo em termos literários.

Adotavam os árcades nomes pastoris, como "Elpino Nonacriense" (Antônio Diniz da Cruz e Silva); "Alcino Micênio' (Reis Quita); "Lícidas Cintio" (Manuel de Figueiredo); "Córidon Erimanteu" (Correia Garção); "Cândido Lusitano" (Francisco José Freire); "Fábio" (Joaquim de Foyos); "Almeno Sincero” (Esteves Negrão).

Segundo dizia Garção, "o poeta não pode perder os antigos de vista, mas, seguindo este rumo, pode largar velas à sua fantasia e voar até descobrir novos mundos. Feliz aquele não imita, mas excede o original".

Cabe aqui lembrar que "Filinto Elísio" (1734-1819)  — padre Francisco Manuel do Nascimento — tornou-se líder de uma capela poética": o grupo da Ribeira das Naus, adversário da Arcádia Lusitana.

Em 1790, foi fundada a "Nova Arcádia", ou "Academia das Belas-Artes de Lisboa", pelo Conde de Pompeiro e por José de Vasconcelos e Sousa, dela fazendo parte Bocage ("Elmano Sadino”), José Agostinho de Macedo ("Elmiro Tagideu"), Curvo Semedo ("Belmiro Transtagano"), Pato Moniz ("Alino") e o brasileiro Domingos Caldas Barbosa ("Lereno").



O ARCADISMO NO BRASIL


O Arcadismo, no Brasil, começou em 1768, com Cláudio Manuel da Costa, vindo até 1836, quando as bases do Romantismo foram lançadas por Gonçalves de Magalhães.

Clóvis Monteiro lembra o seguinte: — "Em verdade a literatura brasileira já nasceu clássica e erudita no século XVII, quando se achava em pleno triunfo o Culteranismo na Europa. Foi culteranista, como a portuguesa, até os meados do século XVIII: daí por diante, até o advento da Escola Romântica, desenvolveu-se em consonância com o Arcadismo, que era animado em Portugal, como na Itália, de espírito reacionário, tendente a prestigiar os verdadeiros princípios da Escola Clássica. Culteranismo e Arcadismo representam, pois, modalidades do Classicismo".

Movimento acima de tudo poético, salientou-se o Arcadismo Brasileiro pela formação de um conjunto harmônico, o principal da nossa história literária, aparecendo como elementos principais Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga, Inácio de Alvarenga Peixoto, Manuel Inácio da Silva Alvarenga, Basílio da Gama (poeta épico do "Uruguai", aliás "Uraguai", publicado em Lisboa no ano de 1769), e Frei José de Santa Rita Durão (poeta épico do "Caramuru", também editado em Lisboa, em 1781).

Estrearam entre 1768 e 1795, com exceção de Alvarenga Peixoto, que não publicou livro. A não ser Gonzaga, que nasceu em Portugal, todos nasceram em Minas Gerais. Por outro lado, menos Basílio, estudaram em Coimbra.

Ronald de Carvalho, referindo-se a esse punhado brilhante de poetas, adotou a designação de "Escola Mineira". José Veríssimo chamou “Plêiade Mineira". Outros falam, simplesmente, em “Grupo Mineiro".

Levando-se. em conta o significado usual de "Escola Literária", que implica na existência de uma doutrina comum e de um chefe, constelação poética não deve receber tal designação. Doutrina comum houve — a do neoclassicismo, ou arcadismo. Não porém, um chefe, muito embora Cláudio Manuel da Costa exercesse uma certa ascendência, pelo menos sobre Tomás Antônio Gonzaga.

Cláudio foi, no Brasil, o primeiro a demonstrar idéias neoclassicistas. Um exímio sonetista e o representante máximo do Arcadismo entre nós. Tomás Antônio Gonzaga não pode ombrear-se a ele, em matéria de soneto, mas é, sem dúvida, um dos maiores poetas brasileiros do século. José Basílio da Gama, eis aí um lídimo poeta, inclusive bom sonetista. Alvarenga Peixoto, pela beleza de seus sonetos esparsos, brilhantes, esbatidos de vaga nostalgia, está relacionado entre os grandes poetas de sua geração. Silva Alvarenga e Santa Rita Durão, que, parece, não escreveram sonetos, fizeram-se, igualmente, autores de decassílabos luminosos, bem feitos, embora não se possa situá-los no mesmo nível de seus companheiros.

O forte desses poetas é o lirismo. E não se pode pôr em dúvida que eles exerceram influência sobre os nossos românticos e parnasianos. Aliás, no Arcadismo mineiro, Sílvio Romero já vê sinais de proto-romantismo, ou seja, transição do Classicismo para Romantismo.

No Rio de Janeiro, foi a "Arcádia Ultramarina" a que gozou de maior renome, a que mais influiu sobre a literatura, embora pouco se saiba de positivo a seu respeito. Teria sido fundada em 1780 (segundo uns) ou 1783 (segundo outros), pelos poetas Manuel Inácio da Silva Alvarenga e José Basílio da Gama, sob o patrocínio do Vice-Rei Dom Luís de Vasconcelos e Sousa e do Duque Dom José Justiniano Mascarenhas Castelo Branco.

Dela foram membros atuantes, entre outros:
Inácio José de Alvarenga Peixoto ("Alceu" e "Eureste Fenício"); Tomás Antônio Gonzaga ("Dirceu"); José Bonifácio, o Velho ("Américo Elísio"); Cláudio Manuel da Costa ("Glauce Satúrnio"); José Basílio da Gama ("Termindo Sirpílio"); Manuel Inácio da Silva Alvarenga ("Alcindo Palmireno"); Domingos Caldas Barbosa (“Lereno”); José Mariano da Conceição Veloso; Manuel Arruda Câmara; João Pereira da Silva; Antônio Cordovil; Baltasar da Silva Lisboa; Frei José de Santa Rita Durão.

Ainda no Rio de Janeiro, houve a "Sociedade Literária". cujas atividades se iniciaram em 6 de junho de 1786, e cujos estatutos, aprovados pelo Vice-Rei Luís de Vasconcelos e Sousa, foram redigidos por Manuel Inácio da Silva Alvarenga, seu principal fundador.

Curioso é o que diz, a respeito, a Delta Larousse: "Afirma-se que essa Sociedade seria a Arcádia Ultramarina reestruturada. Seus sócios principais foram Manuel Inácio da Silva Alvarenga, Mariano José Pereira da Fonseca (depois Marquês de Maricá) e João Manso. Com a mudança do vice-rei, o novo titular, Conde de Resende, interrompeu os trabalhos da Sociedade, em 1794, e, seis meses depois, dissolveu-a, por ver, naquela reunião de literatos, atividades políticas decorrentes do movimento da Inconfidência Mineira.

Já José Veríssimo dá outra versão ao assunto: Ele "nega a existência da Arcádia Ultramarina, dizendo que há confusão dos historiadores entre ela e a Sociedade Literária, que teve duas fases”.



O GRUPO MINEIRO

O "Grupo Mineiro", ou "Plêiade Mineira", floresceu entre 1750 e 1830, na Capitania mais rica e mais populosa do país, ensaiando, por assim dizer, os primeiros passos no sentido da nossa autonomia literária e também política. Era natural que, ao lado da riqueza, se desenvolvesse, igualmente, a cultura. E assim, por uma questão de lógica, o centro cultural da colônia deixou as praias para galgar as montanhas. Vila Rica, São João del Rei e Sabará passaram a ser estrelas de primeira grandeza da intelectualidade brasileira.

A civilização do ouro nos legou figuras insignes de nossas artes, destacando-se (1738-1814) Antônio Francisco Lisboa (o “Aleijadinho”), na escultura e na arquitetura; Manuel da Costa Ataíde, na pintura; e essa coleção de poetas do "Grupo Mineiro".

Honestamente, não se pode negar que o movimento marcou a transição da literatura portuguesa para a brasileira. E trouxe, no seu bojo, outro movimento: o de emancipação, a que se chamou "Inconfidência Mineira".

Diz-nos Ronald de Carvalho, relembrando, ainda, as lutas que tivemos de travar: "Os alicerces de uma nova nacionalidade se _desenhavam nitidamente; a voz do povo já se fazia escutar com acentos e timbres diferentes". (....) "Os doutos e os eruditos estavam ainda presos a Portugal, mas a plebe, o "vulgo profano"... tinha os olhos voltados para a terra natal, para a dura gleba tão espoliada pelos senhores de ultramar". (....) "Alguns homens, mais idealistas que práticos, tomaram a dianteira de um movimento separatista". (....) "Quem fez a Revolução Francesa não foi Voltaire, com as suas sátiras, nem Rousseau, com os seus romances: foi a fome, com as suas dores e misérias. O povo brasileiro padecia, é verdade, mas ainda não resolvera num projeto de revolução seus desejos de viver melhor e mais fartamente. Eis porque o gesto cavalheiresco dos José Maciel e dos Tiradentes falhou lamentavelmente no patíbulo e nos presídios... que a África, inóspita e selvagem, abriu aos desterrados".
Mas, mesmo sacrificados pelos sonhos de cores políticas da Conjuração, os seus principais componentes nos deixaram obras notáveis.

Pertenciam, quase todos, como vimos, à Arcádia Ultramarina. E alguns foram muito bons sonetistas.

Esse grupo não se afastou do Arcadismo. Ao contrário, continuou a ser dele parte integrante. As feições predominantes, no seu lirismo, foram a bucólica e a amorosa.

Vamos desfilar, a seguir, produções de maior significação dos integrantes mais destacados do Grupo.

José Basílio da Gama (1741-1795), neoclássico, tanto na poesia lírica como na épica, revelou-se poeta de largos vôos. É autor do poema épico "Uruguai", aliás "Uraguai", de cinco cantos, em versos decassílabos brancos, focalizando a luta que portugueses e espanhóis moveram contra jesuítas e índios no Sul (Sete Povos das Missões), e contendo episódios brilhantes, como a morte da heroína Lindoia, mulher do cacique Cacambo. Ë, realmente, uma página antológica.

O poema parece anunciar o Romantismo. O seu herói é Gomes Freire de Andrade, que divide as honras com o cacique. Este morre no acampamento incendiado. A índia se suicida, deixando-se morder por uma serpente venenosa. E morta, não perdeu sua beleza:

... Inda conserva o pálido semblante,
um não sei quê de magoado e triste,
que os corações mais duros enternece...
Tanto era bela no seu rosto a morte!


José Basílio da Gama foi, também, um excelente sonetista, como se vê pelo seu soneto conhecido sob o titulo "Marfisa", que, na antologia "Poesia Barroca", de Péricles Eugênio da Silva Ramos, traz o título: "A uma Senhora natural do Rio de Janeiro, onde se achava então o autor":


Já, Marfisa cruel, me não maltrata
saber que usas comigo de cautelas,
que inda te espero ver, por causa delas, 
arrependida de ter sido ingrata.

Com o tempo, que tudo desbarata,
teus olhos deixarão de ser estrelas;
verás murchar no rosto as faces belas,
e as tranças de oiro converter-se em prata:

Pois se sabes que a tua formosura,
por força há de sofrer da idade os danos,
por que me negas hoje esta ventura?

Guarda para seu tempo os desenganos,
gozemo-nos agora, enquanto dura,
já que dura tão pouco a flor dos anos.

______
Verso 1 — Marfisa: o nome surge no "Orlando Furioso", de Ariosto, c. XVIII, 99.  (Péricles Eugênio da Silva Ramos)


É de José Basílio da Gama, igualmente, o bonito soneto "A uma Senhora" (que o autor conheceu no Rio de Janeiro e viu depois na Europa):

Na idade em que eu, brincando entre os pastores,
andava pela mão e mal andava,
uma ninfa comigo então brincava,
da mesma idade e bela como as flores.

Eu, com vê-la, sentia mil ardores;
ela punha-se a olhar e não falava.
Qualquer de nós podia ver que amava,
mas quem sabia então que eram amores?

Mudar de sítio à ninfa já convinha:
foi-se a outra ribeira; e eu só, naquela
fiquei sentindo a dor que na alma tinha.

Eu, cada vez mais firme; ela mais bela.
Não se lembra ela já de que foi minha;
eu ainda me lembro que sou dela!...

______
Nota de Péricles Eugênio da Silva Ramos, em sua "Poesia Barroca", pág. 270:
—"Recolhido por Joaquim Norberto de Sousa Silva, provavelmente por intermédio de Carlos Augusto de Sá, segundo supõe José Veríssimo, que o deu à estampa nas "Obras Poéticas", 1903, pág. 226, e que julga este soneto "talvez o mais belo" de Basílio".


Reproduzimos, também de José Basílio da Gama, o soneto “A resignação", escrito "por ocasião de ser o autor condenado pelo Tribunal da Inconfidência ao degredo de África":

Temam embora a morte os que aferrados
aos grossos cabedais, que possuíam,
nunca tão de repente presumiam
que lhes fossem das mãos arrebatados.

Sintam deixar com a vida os começados
muros de altos palácios, que erigiam;
a cara esposa, os filhos, que cresciam;
os brandos leitos; os tremós dourados.

Que eu, sem bens e sem casa, vagabundo,
mal coberto com o manto da indigência,
já não temo da morte o horror profundo.

No que me tira não me faz violência,
que o melhor modo de sair do mundo
é cheio, ou de miséria ou de inocência.


De sua terra natal, São José do Rio das Mortes (hoje Tiradentes, MG), José Basílio da Gama veio para o Rio de Janeiro, onde começou a estudar no colégio dos Jesuítas. Em 1759, o marquês de Pombal (1699-1782) baixou o decreto que baniu do território do Brasil e das colônias os membros da Companhia de Jesus. Só do Brasil saíram mais de 600 padres. Basílio, que era apenas noviço, foi beneficiado pela própria lei e, assim, permaneceu no país, passando a estudar no seminário episcopal de São José. Logo após, entretanto, seguiu para Portugal e lá viveu isolado, com receio de ser preso.

Os jesuítas o ajudaram a ir para Roma, onde se alistou entre os acadêmicos da Arcádia Romana, adotando o nome arcádico de Termindo Sipílio. Voltou a Portugal em 1767 e veio para o Brasil. No ano seguinte (1768), regressou a Lisboa, sendo detido por ordem de Pombal e denunciado como jesuíta. Conquistou a liberdade, mas, para isso, teve de assinar um documento em que se comprometia a embarcar, no prazo de seis meses, para Angola.

Salvou-o, porém, a poesia. Coincidiu que Maria Amália, filha do marquês de Pombal, se casou; e o poeta publicou um epitalâmio, contando, inclusive, suas agruras e implorando a ajuda do poderoso governante. A sentença foi cancelada e Basílio passou a gozar das graças de Pombal, que o nomeou seu secretário.

Em 1771, recebeu carta de nobreza e fidalguia e, em 1774, nomeado oficial da Secretaria do Ministério do Reino.

Manteve-se fiel a Pombal, não obstante a queda do prestígio deste, a partir de 1776, quando o rei D. José caiu gravemente enfermo, morrendo em 1777.



Tomás Antônio Gonzaga (1744-1809) escreveu "Marília de Dirceu", primeiro grande momento do lirismo brasileiro e, talvez, nesse particular, o livro mais apreciado da nossa língua. Lirismo ingênuo e burguês. É a história dos amores do poeta de 38 anos pela brasileirinha de 16 anos, Maria Dorotéia Joaquina de Seixas, a sua "Marília", de quem era noivo, já de casamento marcado, quando foi preso e banido da pátria, vivendo e morrendo em Moçambique (Africa).

Nasceu no Porto (Portugal), de pai brasileiro e mãe portuguesa, filha de inglês. Mas, diz José Veríssimo: "Foi o Brasil que o fez poeta, e é isto que o naturaliza brasileiro".

Na verdade, mesmo sendo português de origem, muitos o consideram, provavelmente, o mais brasileiro dentre os poetas de seu tempo. E, sem desdouro para Basílio da Gama, revelou-se o mais equilibrado neoclássico da poesia arcádica, em nosso país.

Formado em Direito pela Universidade de Coimbra. Era Ouvidor em Vila Rica, onde, na casa de residência a que, oficialmente, fazia jus, viveu de 1784 a 1789.

Gonzaga também se distinguiu como poeta satírico. Já se admite, hoje, geralmente, ter sido ele o autor principal das famosas "Cartas Chilenas" (1789). Cláudio Manuel da Costa teria sido co-autor desse poema: "Chilenas" equivale a "Mineiras", uma vez que Chile é disfarce de Minas Gerais. Santiago é dissimulação de Vila Rica.

Marília, a menina-moça, morava na Casa Grande, do hoje Largo de Marília, mas costumava deixá-la para passar dias em casa de sua tia D. Ana Cláudia, casada com Antônio Saião. A casa de D. Cláudia era parede-meia com a do Ouvidor. Das janelas desse casarão começou o namoro de Dirceu e Marília. Mas, Gonzaga vira Maria Dorotéia, pela primeira vez, em casa do Dr. Bernardo da Silva Ferrão, "advogado e grã-fino de leituras".

Maria Dorotéia era uma menina de poucas letras, coisa natural naquele tempo, principalmente na idade dela.
Para que a musa "tolinha" pudesse compreendê-lo, Gonzaga — apesar de árcade culto e talentoso de Vila Rica — esmerava-se em escrever com a maior naturalidade e singeleza possíveis, superando o formalismo da escola com suas inesquecíveis liras.

E Marília, que a princípio troçava dos amores daquele quarentão apaixonado, passou a receber presentes e versos do poeta. Os versos simples e amorosos que Gonzaga lhe oferecia, acabaram por envaidecê-la; e, afinal, a mocinha consentiu no namoro, tendo a tia por medianeira. E o namoro, que passou a ser "acompanhado de perto" por toda Vila Rica, transformou-se em amor sincero e, logo depois, em noivado. Diga-se amor sincero muito mais da parte dela, como o futuro veio a provar.

Aliás, o estilo adotado tão inteligentemente por Gonzaga, florido de simplicidade e formosura, e que era aceito com certa surpresa pelos demais "árcades", constituiu-se, para o poeta, num estratagema de maravilhoso efeito, chegando mesmo Jorge de Lima a considerá-lo o verdadeiro precursor do romantismo no Brasil.

Quando da prisão do poeta, a noiva quis acompanhá-lo ao exílio, no que foi proibida pela família. Já em Moçambique, Gonzaga demonstrou desejo de que Marília para lá viajasse, sendo o pedido negado pelo mesmo motivo: a total objeção da família.
Algum tempo depois, Gonzaga, interpretando mal os sentimentos da noiva brasileira, ou julgando-a, talvez, uma ingrata, casou-se com a luso-africana Juliana de Sousa Mascarenhas, uma senhora de cor, muito rica e pouco instruída. Era "herdeira da casa moçambicana mais opulenta em transações de escravatura", segundo Jorge de Lima.
  
Ainda são de Jorge de Lima (Revista "Letras Brasileiras", de maio de 1943, editada pela "A Noite"), estas palavras escritas com uma pitada de ironia: — "Gonzaga triunfou economicamente. Velhice amparada em negócios de escravidão humana. Castro Alves nunca soube disto".

Por seu lado, Marília, em Vila Rica, continuou fiel ao noivo exilado, dedicada aos seus trabalhos domésticos, criando os sobrinhos e jamais se esquecendo do poeta.
Sua vida foi, pois, uma admirável lição de amor. Morreu solteira, em sua terra natal, aos 79 anos de idade.

Gonzaga, como afirma António Cândido, "em nossa literatura é dos maiores poetas, dentre os sete ou oito que trouxeram alguma coisa à nossa visão do mundo; e, nas literaturas românticas do tempo, forma, sem deslustre, ao lado de um Bocage".

"Marília de Dirceu", em que "há muito de confissões pessoais", é composto de três partes: a primeira, publicada em Lisboa, em 1792; a segunda, em 1799; e a terceira é de publicação póstuma.

"Liras", é o título geral das poesias. Dirceu era o nome arcádico de Gonzaga; e Marília o nome poético de Maria Dorotéia. Foi o primeiro livro de poesias brasileiras traduzido para um idioma estrangeiro, no caso o francês (Paris, 1824).

Gonzaga publicou poucos sonetos. Oferecemos, a seguir, das "Liras", um primoroso soneto em que nos fala de seu modo de ser e de agir, como magistrado íntegro que era, em Vila Rica:

Obrei quanto o discurso me guiava,
ouvi aos sábios quando errar temia;
aos bons no gabinete o peito abria,
na rua a todos como iguais tratava.

Julgando os crimes, nunca os votos dava
mais duro, ou pio do que a Lei pedia;
mas devendo salvar ao justo, ria,
e devendo punir ao réu, chorava.

Não foram, Vila Rica, os meus projetos
meter em férreo cofre cópia de ouro
que farte aos filhos, e que chegue aos netos:

outras são as fortunas, que me agouro;
ganhei saudades, adquiri afetos,
vou fazer destes bens melhor tesouro.


Como prova da riqueza de sua lírica, apresentamos este outro soneto, extraído das "Obras Completas"— Ed. Rodrigues Lapa:

Mudou-se enfim Lidora, essa Lidora
por quem mil vezes fé me foi jurada.
Que vos detém, ó céus, que castigada
ainda não deixais tão vil traidora? 

Não haja piedade; sinta agora
a dita sem remédio em mal trocada;
pois, se assim não sucede, fica ousada
para ser outra vez enganadora.

Vingai, ó justos céus... mas ah! que digo?
Que maltrateis Lidora? — O sentimento
privou-me do discurso; eu me desdigo.

Não, não vibreis o raio violento;
pois sei que a compaixão do seu castigo
há de aumentar depois o meu tormento.



Inácio José de Alvarenga Peixoto (1744-1793). Formado em Coimbra. Ouvidor no Rio das Mortes. Casou-se, em São João del Rei, com D. Bárbara Heliodora Guilhermina da Silveira Bueno (1759-1819), tendo nascido dessa união Maria Efigênia, cognominada "princesa do Brasil", pela sua beleza invulgar.

Em 1780, abandonou a magistratura, vivendo abastado, com os lucros da mineração e da lavoura. Foi um dos chefes da conspiração chamada "Inconfidência Mineira". Para legenda da bandeira revolucionária, propôs o verso de Virgílio "Libertas quae sera tamen" (Écloga, I, v. 27).

D. Bárbara ficou famosa pelo seu ânimo varonil, amparando a fé vacilante do marido.

Condenado à morte e com seus bens confiscados, Alvarenga Peixoto teve a pena comutada em degredo perpétuo. Exilado para Angola (África), lá faleceu, velho e esquecido.

É autor de cerca de vinte sonetos conhecidos, entre os quais "Estela e Nize", que está transcrito em outro capítulo deste volume, "Os sonetos brasileiros mais populares". Relembramos, aqui, outro soneto do imaginoso poeta, por ele escrito em 1786, quando a filha, Maria Efigênia, completava sete anos. Domingos Carvalho da Silva, em alguns trabalhos, inclusive num artigo publicado em "O Estado de São Paulo" de 12.8.1961, sob o título "História de um Soneto", atribui sua autoria a Bárbara Heliodora, que era, também, poetisa talentosa:

Amada filha, é já chegado o dia,
em que a luz da razão, qual atocha  acesa,
vem conduzir a simples natureza:
é hoje que o teu mundo principia.

A mão, que te gerou, teus passos guia;
despreza ofertas de uma vã beleza,
e sacrifica as honras e a riqueza
às santas leis do Filho de Maria.

Estampa na tua alma a Caridade,
que amar a Deus, amar aos semelhantes,
são eternos preceitos da Verdade.

Tudo o mais são idéias delirantes;
procura ser feliz na Eternidade,
que o mundo são brevíssimos instantes.

____
NOTA — O 1.° verso do 2.° quarteto: "a mão, que te gerou, teus passos guia..."

pode, realmente, dar lugar a uma dúvida. Pelo menos à primeira vista, teria um sentido mais natural "a mãe, que te gerou..."
Isto atribuiria uma certa força à tese de Domingos Carvalho da Silva, sobre a autoria do soneto, embora Alvarenga Peixoto, mesmo sendo, como pensamos, o verdadeiro autor, pudesse escrever, também, "a mãe que te gerou", referindo-se, não a ele, lógico, mas à própria Bárbara Heliodora. Nesse caso, estaria fazendo alusão a uma terceira pessoa, "a mãe". De qualquer maneira, não nos cabe discutir se, no original escrito em 1786, estava "a mão" ou "a mãe".

Na "Antologia Brasileira", do Prof. Eugênio Werneck (pág. 419); em "Os 150 mais célebres sonetos da língua portuguesa", de José Schiavo (pág. 34); e até na "Vida e Obra de Alvarenga Peixoto" (1960, pág. 39), está, mesmo, "mão", e não "mãe".


Registramos mais este soneto de Alvarenga Peixoto:

Ao mundo esconde o Sol seus resplendores,
e a mão da Noite embrulha os horizontes;
não cantam aves, não murmuram fontes,
não fala Pã na boca dos pastores.

Atam as Ninfas, em lugar de flores,
mortais ciprestes sobre as tristes frontes;
erram, chorando, nos desertos montes,
sem arcos, sem abavas, os Amores.

Vênus, Palas e as filhas da Memória,
deixando os grandes templos esquecidos,
não se lembram de altares nem de glória.

Andam os elementos confundidos:
ah, Jônia, Jônia, dia de vitória
sempre o mais triste foi para os vencidos!

______
NOTA — Neste soneto — Julga o Prof. Rodrigues Lapa — Alvarenga fala de sua própria  derrota por outro candidato ao amor de D. Joana Isabel, presumivelmente José Anastácio da Cunha, também poeta e lente de Matemática Universidade de Coimbra, uma das "mais pujantes genialidades" da cultura portuguesa. Anastácio aparece por volta de 1774 na vida de D. Joana Isabel.
             (Péricles Eugênio da Silva Ramos)



Cláudio Manuel da Costa (1729-1789) foi outro expoente do “Grupo Mineiro", e um dos maiores poetas do período colonial, autor do poema "Vila Rica", enaltecendo os feitos dos bandeirantes e a fundação de Vila Rica. Poema rigorosamente arcádico, compõe-se de dez cantos, em versos decassílabos de rima emparelhada.

Nasceu nas proximidades de Vila do Ribeirão do Carmo, que, desde 1745, "passou a ser a cidade episcopal de Mariana". Seus pais viviam de lavoura e mineração.

Foi ótimo sonetista, a ponto de João Ribeiro achar que nas Literaturas Latinas era superado, apenas, por Petrarca e Camões. Na opinião de Alberto de Oliveira, Cláudio foi o maior sonetista da língua, em todo o espaço aberto entre Camões e Bocage. Alceu Amoroso Lima revela que foi Cláudio Manuel da Costa "o primeiro escritor brasileiro citado numa história universal da literatura, na obra de Bouterwek".

Cláudio chegou a preconizar a fundação de uma Academia, em Vila Rica, "Colônia Ultramarina", para repetir a "Arcádia Romana".

Formado em Direito canônico, pela Universidade de Coimbra. Foi Secretário do Governo da Capitania de Minas.

Tímido e triste, foi colhido nas malhas da conspiração mineira, suicidando-se quando se encontrava preso na Casa dos Contos, em Vila Rica.
Tinha uma vida respeitável e deixou muitos bens. Mas, seu nome há de ficar imortalizado, acima de tudo, como sonetista. O Prof. Eugênio Werneck escreveu em sua "Antologia Brasileira": "Almeida Garret fá-lo rival de Metastásio; e Camilo Castelo Branco considera-o, sob muitos aspectos, superior a Bocage, o consagrado mestre do soneto em português".

Muito embora bebesse nas fontes arcádicas, sua poesia está cheia de paisagens brasileiras. E seu lirismo é rico de beleza, elegante e sonoro.

Eis o soneto "Nize" (XIII):

Nize? Nize? onde estás? Aonde espera
achar-te uma alma que por ti suspira,
se quanto a vista se dilata e gira,
tanto mais de encontrar-te desespera?

Ah! se ao menos teu nome ouvir pudera
entre esta aura suave, que respira!
Nize, cuido que diz; mas é mentira.
Nize, cuidei que ouvia; e tal não era.

Grutas, troncos, penhascos da espessura,
se o meu bem, se a minha alma em vós se esconde,
mostrai, mostrai-me a sua formosura!

Nem ao menos o eco me responde!
Ah! como é certa a minha desventura!
Nize? Nize? onde estás? aonde? aonde?


Mais um soneto desse grande poeta:

Não se passa, meu bem, na noite e dia,
uma hora só, que a mísera lembrança
te não tenha presente na mudança
que fez, para meu mal, minha alegria.

Mil imagens debuxa a fantasia,
com que mais me atormenta e mais me cansa:
pois se tão longe estou de uma esperança,
que alívio pode dar-me esta porfia!

Tirano foi comigo o fado ingrato,
que crendo, em ti roubar, pouca vitória,
me deixou para sempre o teu retrato:

eu me alegrara da passada glória,
se, quando me faltou teu doce trato,
me faltara também dele a memória!


A poesia de Cláudio Manuel da Costa, equilibrada entre o Barroco e a Arcádia, com muitas auras do quinhentismo, atinge um nível bastante elevado:

Ai, Nize amada! se este meu tormento,
se estes meus sentidíssimos gemidos
lá no teu peito, lá nos teus ouvidos
achar pudessem brando acolhimento;

como alegre em servir-te, como atento
meus votos tributara agradecidos!
Por séculos de males bem sofridos
trocara todo o meu contentamento.

Mas se na incontrastável pedra dura
do teu rigor não há correspondência,
para os doces afetos de ternura;

cesse de meus suspiros a veemência;
que é fazer mais soberba a formosura
adorar o rigor da resistência.

_______
NOTA — O soneto, dos mais musicais de Cláudio, ostenta figuras de palavras e aliterações, sábia distribuição de tônicas e versos amplamente sugestivos, como os dois últimos da segunda quadra.
              (Péricles Eugênio da Silva Ramos)


Dele, outro expressivo soneto (XXXII):

Se os poucos dias, que vivi contente,
foram bastantes para o meu cuidado,
que pode vir a um pobre desgraçado,
que a idéia de seu mal não acrescente!

Aquele mesmo bem, que me consente,
talvez propício, meu tirano fado,
esse mesmo me diz que o meu estado
se há de mudar em outro diferente.

Leve, pois, a fortuna os seus favores;
eu os desprezo já; porque é loucura
comprar a tanto preço as minhas dores:

se quer que me não queixe a sorte escura,
ou saiba ser mais firme nos rigores,
ou saiba ser constante na brandura.

_______
NOTA — "O Poeta receia o próprio bem futuro, pois a lembrança deste o atormentará depois".
             (Péricles Eugênio da Silva Ramos)


No soneto que se segue, "o humor do poeta enegrece a natureza":

Que tarde nasce o Sol, que vagaroso!
Parece que se cansa de que a um triste
haja de aparecer: quanto resiste
a seu raio este sítio tenebroso!

Não pode ser que o giro luminoso
tanto tempo detenha: se persiste
acaso o meu delírio! se me assiste
ainda aquele humor tão venenoso!

Aquela porta ali se está cerrando;
dela sai um pastor: outro assobia,
e o gado para o monte vai chamando.

Ora, não há mais louca fantasia!
Mas quem anda, como eu, assim penando,
não sabe quando é noite, ou quando é dia.


Finalmente, mostramos este soneto onde "a natureza toda se abala com a morte de Nize. Tal solidariedade entre pessoas e seres, várias vezes explorada por Cláudio, assume neste soneto belos tons" (Observação de Péricles Eugênio da Silva Ramos):

Parece, ou eu me engano, que esta fonte
de repente o licor deixou turvado;
o céu, que estava limpo, e azulado,
se vai escurecendo no horizonte:

Por que não haja horror, que não aponte
o agouro funestíssimo, e pesado,
até de susto já não pasta o gado;
nem uma voz se escuta em todo o monte.

Um raio de improviso na celeste
região rebentou : um branco lírio
da cor das violetas se reveste;

será delírio! não, não é delírio.
Que é isto, pastor meu? que anúncio é este?
Morreu Nize (ai de mim), tudo é martírio.




OUTROS POETAS

Paralelamente ao "Grupo Mineiro", surgiram outros poetas de menor importância. Na poesia satírica, João Pereira da Silva, Antônio Mendes Bordalo, Costa Gadelha; e na poesia lírica, Domingos Vidal Barbosa, Domingos Caldas Barbosa, Bento de Figueiredo Tenreiro Aranha.

O Padre Domingos Caldas Barbosa (1738-1800), autor de modinhas e lundus enfeixados em sua "Viola de Lereno", foi um cantor de grande popularidade, apontado como um dos mais destacados poetas que antecederam a época do Romantismo.

De Bento de Figueiredo Tenreiro Aranha, nascido no Amazonas e falecido no Pará (1769-1811), é este soneto, dedicado "À mameluca Maria Bárbara".
O "título-dedicatória" deste soneto é: "À mameluca Maria Bárbara, mulher de um soldado, cruelmente assassinada no caminho da Fonte do Marco, perto da cidade de Belém, porque preferiu a morte à mancha de infiel ao seu esposo".


Se acaso aqui topares, caminhante,
meu frio corpo já cadáver feito,
leva, piedoso, com sentido aspeito,
esta nova ao esposo aflito, errante.

Dize como de ferro penetrante
me viste, por fiel, cravado o peito,
 lacerado, insepulto, e já sujeito
o feio tronco ao corvo altivolante.

Que de um monstro inumano, lhe declara,
a mão cruel me trata desta sorte;
porém que alívio busque à dor amara,

lembrando-se que teve uma consorte
que, por honra da fé, que lhe jurara,
à mancha conjugal prefere a morte.







(Das páginas 526 a 543 de “O Mundo Maravilhoso
do Soneto”, de Vasco de Castro Lima)


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